domingo, 25 de abril de 2010

[25] Volta ao mundo em 36 dias

Muito curioso o comportamento dos europeus no aeroporto de Bangkok. Principalmente os que estavam fazendo o que chamam de "budget trip" ou mochilão; pareciam refugiados ou, realmente, sobreviventes de uma catástrofe.

Presos no aeroporto, eles ficavam aguardando o próximo horário que serviriam comida. Andando descalços pra todo lado, ficavam sedentos por novas informações. Quando acessavam a internet era para descrever para alguém, via email, o drama que estavam passando no aeroporto ou para procurar, em vão, novos vôos.

Alguns diziam que, depois de 4 dias sem ver a luz do sol, começavam a ficar deprimidos, mas que tinham medo de deixar o aeroporto e perder uma chance de voltar pra casa, mesmo sabendo que na lista de espera já haviam milhares de pessoas.

O pior era ver os idosos, as famílias e as grávidas sofrendo com a falta de assistência das companhias aéreas que diziam que os cancelamentos de vôos não eram culpa delas. E não era mesmo, mas isso não diminui a angústia de ninguém.

Cheguei a dormir uma noite no aeroporto. Às 23:30 hs do dia que perdi o vôo para Londres ainda estava tentando um lugarzinho num vôo pra Roma. Mas ao ver que uma grávida, seu marido e seu filhinho de 2 anos, não conseguiram e teriam que ficar a 3a noite no aeroporto, perdi as esperanças de voltar pela Europa.

Mas, depois de dormir no aeroporto, tive uma idéia, tentar ir via Thai Airways mesmo para Los Angeles (ao invés de Londres), eles também voavam para esse destino.

E deu errado! A Thai foi inflexível. Falei com o "Atendimento a Clientes" que pediu para mim ir a área do check-in 3 horas antes do vôo. Fui e disseram que só poderiam trocar para a Europa. Então diante de minha insistência me encaminharam pra supervisora, que depois de não resolver perguntou se eu queria falar com o gerente. Aí eu falei se teria que falar com o rei também. Pra quê, a mulher ficou furiosa e achei que estava prestes a chamar os seguranças. O rei, na Tailândia, parece ser mais importante e respeitado que o papa, no mundo.

O cenário, adornado pelas cinzas do vulcão, era realmente nebuloso e percebi que não fazia sentido ficar no aeroporto competindo com milhares de europeus que perderam os vôos por 4 dias antes de mim. Assim, decidi voltar para onde estava hospedado e tentar rotas alternativas que não passassem pela Europa.

No ônibus na saída do aeroporto conheci Benetta, uma italiana de 64 anos que estava vivendo na Ásia há decadas. Benetta estava na Indonésia e disse que sobre muitos eventos realmente não temos controle, mas que isso não era o que acontecia mais frequentemente. Hoje em dia muitas pessoas não estão plenamente conscientes do curso de suas vidas e da responsabilidade que cada um tem com relação aos acontecimentos que lhe afetam. Ela contou que tinha acabado de conhecer na Indonésia um homem 63 anos que tinha o sonho de morar na Inglaterra onde vivera até os 6 anos. Esse homem disse que só não se mudava porque não conseguia vender sua casa. Benetta disse que então perguntou se ele havia colocado nos classificados ou exibido uma placa de vende-se em frente sua casa, ao que ele respondeu que não, nunca. Ela ficou estupefata com a resposta e achava que no fundo ele talvez não quisesse ir para a Inglaterra. Quantos de nós não sonhamos com algo, mas nos esquecemos de "por no classificados" ? Uma grande jornada começa com um pequeno passo...

Da sala de internet do hotel, liguei via Skype pro Brasil para tentar resolver minha situação, mas foi só com a ajuda de horas de dedicação de meu irmão e de minha namorada que conseguimos rearranjar minha volta.

Ao invés de terça, o vôo sairia de Bangkok na sexta-feira. Não iria para a Europa, mas para a China, depois Nova York nos EUA, para finalmente chegar em São Paulo e no Rio no sábado a noite.

Na terceira e última despedida de Bankgok (a primeira foi após uma semana de viagem) fui conhecer o que dizem ser o maior museu do sudeste asiático, o Museu Nacional.

Havia no museu objetos ligados a vida dos Thais desde a pré-história, começando pela idade da pedra e dos metais. Curioso ver como mudavam as ferramentas para obter/armazenar comida e água bem como criavam novos enfeites/adornos como colares, pulseiras e brincos.

No museu é mostrada a evolução do homem a medida que ele deixava de ser caçador/coletor nômade para ser agricultor e pecuarista e então comerciante para, finalmente, se organizar em sociedade. Surgem então os líderes e seus soldados que, diferentemente dos do ocidente, usavam elefantes como transporte e não cavalos. Além disso, no museu, boa parte das pinturas, das esculturas, e dos demais objetos referenciavam a religião, principalmente o budismo, além de algo sobre o hinduísmo.

Fiz alguma scompras e voltei cedo ao hotel: 17:00 hs. No dia seguinte, quando partiria, li no jornal que às 20:00 hs do dia anterior 3 bombas haviam sido lançadas no centro e que uma delas atingira a estação de Sky Trem na Siam Square, pela qual tinha passado: 3 pessoas morreram e cerca de 75 ficaram feridas.

Bem, foram 30 horas de vôo e mais 15 horas de espera entre os vôos, totalizando 45 horas de Bangkok ao Rio! Como voei sobre o oceano Pacífico e não pelo Atlântico como na ida, completei uma volta ao mundo de avião! Brasil => Inglaterra => Sudeste Asiático (4 países) => China => EUA => Brasil. Como sempre digo, "se rendeu uma história, valeu"... Acho que essa viagem rendeu várias...

Finalizo o texto e a viagem com a certeza de que algumas imagens e sabores ficarão gravados para sempre: as motos de Hanói; o leite de coco com pimenta de Bangkok e os molhos salty, sweet, sour, spicy e bitter; os templos budistas; os Tuk tuks; arroz cozido na água ou no vapor; mergulho da Tailândia; passeio de elefante na Tailândia; o Rio Mekong; peixes do Rio Mekong; café gelado; sopa da manhã; monges com manto abóbora; camponesas com chapéu-cônico; frutos do mar; cachoeiras na Tailandia; história dos guerilheiros vietnamitas; cafés do Vietnã; lascas de manga verde com casca passada no sal com pimenta; templo de Angkor; camisetas Same Same But Diferent, In the Tubing Vang Vieng, 7 Eleven, e as das cervejas Chang, Singha, Tigre, Laos Beer, Hanoi Beer, Saigon Beer e Angkor Beer; uso de adesivo nas camisetas como bilhete de passagem; mão de direção inglesa na Tailândia; buzinas no Vietnã; calor úmido; referências às taratarugas, elefantes, tigres e dragões; águas claras e mornas do sul da Tailândia.
P.S. Vou disponibilizar o endereço onde algumas fotos poderão ser vistas em um ou dois dias.

2 comentários:

Licia disse...

Anderson,
ler o fim da sua mensagem me fez relembrar a minha viagem, nossa, que saudade!!!!
Espero que as minhas dicas realmente tenham ajudado.
Tô programando uma ida ao Rio, vamos ver se a gente se encontra.
Beijos

Anônimo disse...

Padilha,

admiro seu espírito aventureiro. Acompanhei atentamente a questão do vulcão islandês e lembrei que você poderia ser prejudicado. Ao ver seu relato, fiquei feliz por você ter encontrado outra alternativa. Como você disse, essa viagem rendeu grandes histórias com direito a um desfecho e tanto! Parabéns pelo seu espírito desbravador, posso dizer que conheço um amigo que deu uma volta ao mundo! Abs. Janja